Gilson Moura Henrique Junior – Setorial de Meio Ambiente do PSOL Pelotas

A crise sistêmica iniciada pela pandemia do Coronavírus ou COVID-19, promove uma série de reflexões que sob o ponto de vista ecossocialista precisam ser discutidas coletivamente, em especial pela esquerda.

            O isolamento social que foi implementado na maior parte  das nações industrializadas como a Índia, China, Itália, Espanha, Estados Unidos e Brasil (em maior ou menor grau) provocou como efeito colateral uma série de melhorias relativas à poluição do ar e da água, além de efeitos pouco nítidos, como a redução de 30% a 50% do ruído sísmico no planeta Terra.

            Não concordamos com a leitura desses efeitos que dão conta deles como um exemplo de como o ser humano é um problema ambiental e que uma pandemia é positiva por reduzir a atividade do capital e do homem na Terra, mas identificamos aqui um potencial de reflexão sobre o impacto do sistema na qualidade da vida no planeta e no potencial que uma conversão de nossa atividade como um todo em ações sustentáveis, equilibradas com o meio ambiente.

            Há muito sabemos que a atividade industrial alimenta uma série de outros tantos efeitos que destroem o meio ambiente, da mineração ao consumo, mas o principal efeito, que é o impacto imediato nos diversos biomas, é causado pela produção de demandas infinitas em um mundo com recursos finitos.

            Ou seja, a produção se justifica pela demanda, mas a provocação da demanda é causada pela obsolência programada. Cada celular, geladeira, automóvel, avião, máquinas desenvolvidas para a produção industrial e até os equipamento usados para a mineração e produção de alimentos têm uma vida útil, mas essa vida útil tem seu fim acelerado por uma série de ações conscientes de fabricantes para que sua obsolência mantenha o consumo, e o lucro, em alta.

            Essa lógica influencia todo o resto da vida no planeta, pois envolve a própria ideia de que a centralidade do consumo é também explícita na centralização decisória, produtiva, política e econômica.

            A agroindústria e sua expansão irracional que avança sobre matas nativas, povos originários, e produz uma ampliação do acesso também de microorganismos a novos hospedeiros, vive em um processo onde nosso consumo é abastecido de forma irracional, alimentando demandas que expandem a desigualdade, porque temos produção suficiente para alimentarmos toda a população mundial, mas o acesso a esta produção é reduzido e também sua qualidade é distribuída de forma também desigual.

            A produção de alimentos que faz a fronteira agrícola, e sua ação predatória, ter acelerada expansão não atinge o resultado de alimentar toda a população com igual qualidade porque a exigência de lucro faz com que a produção obedeça não à resolução da fome, mas à manutenção da lucratividade dos proprietários da produção.

            A mesma coisa se dá na produção de bens tecnológicos ou de maquinário ou a ampliação de transporte.

            Fazemos uso de idas e vindas de navios, aviões, trens para o transporte de pessoas e mercadorias, entre elas alimentos, de forma irracional e sem que tenhamos uma necessidade real da maioria deste deslocamento.

            Há meios de produção de alimentos de forma descentralizada e racional que dá conta da demanda mundial por comida, da mesma forma que temos meios de fazer com que máquinas, computadoras e celulares durem mais e mais sem a necessidade de aumento da produção de forma predatória, ou da fronteira agrícola.

            Há meios de produzir carne, grãos e vegetais em gera, não só sem a necessidade de agrotóxico, como de forma planejada e racional para o abastecimento da população.

            Vale lembrar que tanto a pandemia atual com as epidemias anteriores (gripe suína, aviária, Ebola, MERS e Vaca Louca) são provenientes de um consumo cada vez mais estimulado e intenso de proteína animal, que tem se tornou muito mais um fetiche do que uma necessidade nutricional propriamente dita.

            Atualmente, cerca de três em cada quatro novas doenças são zoonóticas.

            Da mesma forma há meios de reduzir o uso de minérios e componentes eletrônicos reduzindo a obsolência programada.

            Computadores, por exemplo, não precisam ser substituídos a cada ano porque a melhoria tecnológica no âmbito dos sistemas operacionais e softwares não trazem consigo uma necessidade de obtenção de novos equipamentos pela maioria da população.

            Grande parte da compra de novos equipamentos é obrigada por uma construção falsa de demanda, pela provocada obrigatoriedade que softwares proprietários e sistemas operacionais fazem de renovação de atualização de software e hardware, sem que o desempenho seja qualitativamente tão superior ou necessário para a maioria dos usuários.

            O mesmo ocorre com celulares, smartphones e tablets. E cada computador e assemelhados adquirido move uma mola do sistema que faz do transporte à mineração serem armas apontadas para a cabeça do planeta.

            Por essas questões a reflexão que a pandemia do COVID-19 nos traz é do debate a respeito da produção e planejamento democrático de todo o processo até os limites de nossa expansão agrícola e urbana possuem, inclusive na revelação e expansão de novas doenças com os microorganismos que as causam usando nossa própria tecnologia e aumento de integração tecnológica de transporte como meio de expandir seu raio destruidor.

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