A luta das mulheres não é recente. Pelo contrário, se hoje temos a garantia legal de reconhecimento como seres humanos de direito, é por conta da coragem e luta de muitas mulheres que deram suas vidas para que chegássemos até aqui.

Nossas batalhas nunca foram fáceis. Se rebelar contra o patriarcado é uma tarefa bastante dura.

Nessa lógica, muitas mulheres acabaram invisibilizadas, sem reconhecimento público, ignoradas na história oficial. Ao longo de nossa trajetória escolar, por exemplo, nos deparamos com grandes figuras masculinas, aparentemente os únicos responsáveis pelos maiores feitos da humanidade. Por que a nós mulheres nos é negada a história das nossas vidas, lutas e conquistas? Porque não estudamos Olympe de Gouges, Rosa Luxemburgo, Carolina Maria de Jesus, Lélia Gonzales, Angela Davis, entre tantas outras que tiveram enorme importância para a civilização humana? Porque não estudamos a resistência das mulheres quilombolas, das mulheres curdas, das zapatistas? Certamente para que não tenhamos exemplos nem consciência da nossa própria história.

Chegamos, no entanto, em mais um 8 de março, Dia Internacional da Mulher, data que marca a luta de mulheres trabalhadoras que se organizaram e se rebelaram na busca por igualdade de direitos. Como parte de um processo de apagamento da simbologia desta data, tradicionalmente, nos são oferecidas tentativas de “reconhecimento” por sermos tão boas mães, donas de casa, cuidadoras, belas, sensíveis e por aí vai. Estereótipos do que é ser mulher nessa sociedade machista e patriarcal, que se utiliza do nosso trabalho não remunerado para perpetuar a “superioridade” masculina e que, infelizmente, ignora nossos papéis enquanto protagonistas de nossas vidas e enquanto seres atuantes na história mundial. Enquanto nos dão flores e bombons, continuamos sendo oprimidas, exploradas, violadas e mortas por quem deveria estar ao nosso lado reivindicando equidade de direitos entre homens e mulheres.

Apesar de toda a invisibilização, não podemos ignorar nossas conquistas. É inegável que nossa história tem ganhado, gradativamente, um outro patamar. Temos tido cada vez mais consciência sobre nossa situação desigual na sociedade e, por essa razão, reconhecemos mais amplamente a importância da luta das mulheres trabalhadoras, pobres, mães, negras, indígenas, imigrantes. Mulheres que estiveram e estão na linha de frente por uma sociedade anticapitalista e antirracista. Como foi, no caso do Brasil, Marielle Franco, negra, da favela, LGBT que, com toda sua força, incomodou e desacomodou. Por isso, foi executada. Tentaram aniquilar suas ideias, porém, Marielle se tornou inspiração pela grandiosidade de sua história e pela defesa incansável de suas pautas. Sua morte brutal, em que seus algozes ainda não foram identificados e punidos, nos faz perceber o quanto devemos resistir. Marielle é semente que germina em cada canto do planeta através das lutas das mulheres. A história da mulher negra, lésbica, mãe, cria da Favela da Maré nos mostra, todos os dias, que não podemos cansar. Dia 14 de março completa um ano de sua morte. Não esqueceremos. Não vão inviabilizar sua história, nós não permitiremos!

É por essa razão que a luta das mulheres e a luta feminista não pode ser superficial. É preciso radicalizar no sentido de transformar, de fato, nossa sociedade. Não basta se dizer apoiador ou apoiadora das nossas causas, há que se estar efetivamente lutando contra as injustiças e a exploração do sistema capitalista que nos oprime e é negligente com nossas vidas.

Em uma breve análise de nossa conjuntura atual, podemos refletir sobre como a política do grande capital é inimiga das mulheres e porque é necessário uma luta radical, engajada na construção de uma sociedade anticapitalista e antirracista.

Bolsonaro (PSL), apesar de tentativas de mascarar seu machismo, se dizendo apoiador da luta das mulheres, tem demonstrado a que veio. Em seu governo, correspondendo aos alertas que fizemos durante as eleições, temos sido incessantemente atacadas. Através da flexibilização da posse de armas, que certamente fará aumentar a violência contra as mulheres no país; com propostas como Escola sem Partido, que nos impede de falar sobre as desigualdades de gênero e sobre diversidade nas escolas; com a falta de projetos sérios para áreas fundamentais como saúde e educação (que inclusive podem ter redução de recursos); com o apoio a projetos que nos impedem de ter acesso a interrupção da gravidez em casos que hoje são previstos na lei como o estupro, a anencefalia e o risco de vida; e com a temerosa e catastrófica reforma da previdência, que nos levará a trabalhar até a morte numa falsa “igualdade de direitos”, que não considera a tripla jornada de trabalho que é realidade na vida de muitas mulheres brasileiras.

A nível estadual, o governador Eduardo Leite (PSDB) pretende entregar todas as nossas riquezas para empresas privadas, sem realizar debate com a sociedade, passando por cima da própria constituição estadual. Isso trará, conforme outros exemplos encontrados na história recente do Brasil e do mundo, certamente, consequências nefastas como aumento de tarifas e diminuição de arrecadação e, em contrapartida, diminuição de investimento nas áreas sociais, aumentando ainda mais a precarização dos serviços públicos e o enriquecimento das grandes corporações que exploram nossa mão de obra, cada vez mais debilitada de direitos trabalhistas e previdenciários.

Em Pelotas, temos a primeira mulher a frente do Executivo. Paula Mascarenhas (PSDB), que também é professora, tem seguido a lógica de ataque a setores majoritariamente femininos como a educação. Pesquisas demonstram que a desvalorização salarial das educadoras é um problema de desigualdade de gênero. Paula, ao propor a retirada de direitos dessas trabalhadoras, corrobora com essa desigualdade. Importante lembrar que Pelotas ainda não paga o Piso Nacional do Magistério. Além disso, apresenta instituições em situações precárias e poucas vagas em escolas infantis. Certamente, são as mulheres trabalhadoras que mais sofrem com a falta dessas políticas, pois muitas são chefes de família e não têm onde deixar seus filhos para poderem trabalhar. Já na área da saúde, a suspeita das fraudes dos exames citopatológicos ainda é uma preocupação para as mulheres que dependem do SUS para realização dos exames e três mulheres que foram vítimas de falsos negativos já faleceram. A violência obstétrica segue presente: muitas vezes não há leitos de maternidade suficientes para suas parturientes, tendo estas que peregrinarem em busca de um hospital que as acolha, sendo que algumas acabam indo para outras cidades parir seus filhos. Os índices de feminicídios e de outras formas de violência só aumentam e não há uma política habitacional para as mulheres que são vítimas de violência, o que reforça o ciclo da violência.

Diante desse cenário, fica cada vez mais nítido que para efetivamente estar na defesa dos nossos direitos é preciso comprometimento com nossas pautas e um trabalho real de combate às desigualdades históricas de gênero. Por essa razão, a frase “não basta ser mulher” é tão imprescindível para entendermos que, ao ocuparmos um espaço de decisão, nossa luta deve estar pautada na transformação social e não na manutenção deste sistema que é excludente, desigual e violento. Pois não é possível construirmos uma sociedade igualitária e justa com uma política que defende ideias totalmente contrárias ao que se entende por igualdade/equidade e que colabora com a ascensão do capitalismo, da opressão e da exploração.

Nosso mandato tem levado estas e tantas outras pautas para reflexão e debate dentro do Legislativo municipal. Temos buscado efetivar as leis aprovadas e construir coletivamente legislações que sejam, de fato, baseadas nas nossas necessidades enquanto mulheres pelotenses. Para pautar o mês de março como um marco de luta feminista, apresentamos quatro projetos de lei que versam sobre o combate à violência obstétrica, a humanização do parto, o combate à violência contra a mulher e a garantia de vagas para mulheres nos postos de trabalho. Sabemos que não serão lutas fáceis, mas temos certeza que são propostas imprescindíveis na ampliação dos nossos direitos. E esse é um compromisso do mandato do PSOL aqui na Câmara de Vereadores de Pelotas.

Este ano, o 8M será marcado como o primeiro grande ato contra os retrocessos do Governo Bolsonaro. As mulheres, mais uma vez, na linha de frente, mostrarão sua força contra as políticas nefastas deste desgoverno e seus seguidores. A classe trabalhadora deve estar unida mostrando que o capitalismo está em crise e que não será com nossas vidas que pagaremos essa conta. Que não permitiremos o retorno ao obscurantismo, às perseguições, ao retrocesso. Nós mulheres nos levantamos contra os ataques à população e estaremos com o punho cerrado a favor das nossas vidas, por uma sociedade livre, igualitária e solidária.

Contra a reforma da previdência!

Em defesa de nossas vidas!

Por justiça para Marielle!

Publicado por Fernanda Miranda

Professora, mãe, estudante de Psicologia, moradora do Areal Fundos. Estou vereadora no primeiro mandato do PSOL - Partido Socialismo e Liberdade - em Pelotas.

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