*Gilson Moura Henrique Júnior e Júlio Araújo

O PSOL tem tradicionalmente um movimento duplo em sua história. Ao mesmo tempo em que cresce sua importância na sociedade, crescem suas contradições e fragilidades organizativas e programáticas.

Nas eleições à presidência da Câmara dos deputados, o que seria uma saudável divergência de métodos e percepções da conjuntura se tornou uma contradição visível na própria conduta teórico-metodológica, não apenas da base parlamentar do partido, mas também de sua organização interna.

Não vou entrar aqui no caminho das decisões pró ou contra o lançamento de candidatura própria, mas no interior da tomada das decisões.

A base partidária não participou em momento algum, nenhuma reunião com núcleos ou plenária foi chamada, nenhum posicionamento ou consulta foi feita, nem mesmo no interior da maior parte das correntes.

Isso, no entanto, não é um problema, “porque o PSOL tem um programa sólido, fruto da unidade e convergência de seus membros, correto?”

Nada mais errado.

O programa é um arremedo que jamais foi reformulado e que apresenta um conjunto de palavras de ordem, sem um sentido que aponte para saídas estratégicas ou táticas.

Então podemos pensar que o partido pelo menos tem uma profunda organização de suas instâncias que discutiram os cenários previamente, antes mesmo das eleições e que tem caminhos para as decisões tomadas? 

Errado de novo.

O PSOL lamentavelmente tem um funcionamento errático institucionalmente, na maior parte das vezes as forças hegemônicas de cada cidade decidem a forma como o partido ali se organiza, a quantidade de instâncias que funcionam, como e em que investir, quantas plenárias devem existir e ainda o que as plenárias discutirão. E quando acontecem plenárias, poucas vezes as informações sobre o que se discute nacionalmente circulam para fora das correntes. E muito menos há uma reunião para discutir pauta que tenha em vista a participação coletiva.

O problema são as correntes? Não, o problema é a falta de partido. A diversidade interna, inclusive de método, é saudável, o que não é saudável é a necessidade de ser parte de uma corrente para ter informações, e mesmo assim olhe lá se a corrente as circula.

O PSOL tem diante de si desafios que vão além de apoios no Congresso e o coração deles é definir sua organização interna, suas necessidades táticas e sua estratégia.

O PSOL tem setores revolucionários que não sabem exatamente qual o caminho dessa revolução, passo a passo, com especificidade que só a tática propõe.

E falar em tática não é dizer que o PSOL precisa ser ecossocialista ou investir na organização sindical, é discutir em detalhes de como proceder para o programa ecossocialista ou a organização sindical funcionar.

Temos que saber qual nossa estratégia e depois a tática para ela, e reformulá-las sempre que for necessário.

Queremos uma organização antirracista, anti-machista e anti lgbtfóbica? Precisamos de uma percepção disso, com formação, integração de mais e mais membros de cada grupo social atingido, com espaço de poder para eles, com calendário de intervenção nas instituições, projetos, financiamento de atividades e resultados, eleitorais e organizativos pensados, obviamente, coletivamente.

Queremos que essa organização também seja revolucionária? De novo, formação, agenda, projetos, etc.

Em resumo, o PSOL precisa saber o que quer de fato e como vai chegar lá. Para isso precisa ter ou uma convergência global entre suas forças na direção conjunta para um caminho que permita atingir estes objetivos estratégicos e táticos ou mecanismos institucionais de construção de uma unidade de ação baseada na correlação de forças e respeito às decisões tomadas a partir dela.

Em nossa avaliação, o partido deveria ter um objetivo tático imediato: construir uma taxa de crescimento e organização que sustente uma rede de ações partidárias e político-institucionais que contribua para o crescimento de participação política no parlamento e no executivo.

Traduzindo: O PSOL precisa construir uma candidatura própria que repita o efeito que Boulos causou nas eleições paulistanas e que tenha um ganho organizativo claro, com maior inserção parlamentar de negros e negras, trans, LGBTs, mulheres, indigenas,etc. Isso é o princípio de um crescimento que amplia a força de intervenção política na sociedade, especialmente em um quadro onde o pós-bolsonarismo é uma realidade.

E a estratégia? Bem, a estratégia é uma Revolução ecossocialista com ênfase na subversão do domínio da branquitude masculina cis hetero normativa. 

A percepção da necessidade de projeto de sociedade com descentralização econômica, respeito ao meio ambiente, às sabedorias tradicionais, à construção de um mundo baseado na coletividade ecologicamente sustentável, no fim da lógica de consumo, compartilhamento de conhecimento com foco no desenvolvimento humano, planejamento democrático da economia e das liberdades, entre outras pautas.

Para atingir o segundo, precisamos do primeiro e para ambos precisamos de um programa que tenha mais a força de uma convergência da produção marxista contemporânea e com toda a força do pensamento que derruba o colonialismo dos pensares, que abraça questões não ocidentais, mas formadoras de nossas independências teóricas, como a noção de Ubuntu e a gama de conhecimentos indígenas que influenciam na própria percepção de nossa relação com o planeta e conosco.

O PSOL ganha onde suas cores são múltiplas, suas sexualidades livres, sua identidade de gênero ampla e sua voz mais e mais feminina, preta e indígena.

O PSOL cresce abrindo os raios de seu sol para construir a diversidade e não um calhamaço de divergências que acabam esquecendo o principal: nós somos a diferença.

*Gilson Moura Henrique Júnior é Historiador e militante ecossocialista do PSOL. Júlio Araújo é Estudante de Direito e militante da Setorial de Negras e Negros do PSOL Pelotas

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